domingo, 17 de abril de 2016

Xadrez.

Olha lá o pião, prostrado ao lado de outros iguais a ele, todos sobre um mesmo tabuleiro, um tabuleiro pequeno para todos. Ao vê-los assim perfeitamente alinhados, me vêm a cabeça um muro ou muralha, o de Berlim ou da China como queiram, um paredão intransponível, uma linha invencível, uma faixa forjada por célebres guerreiros, todos fidedignos ao seu Rei, porém, do outro lado do tabuleiro, logo a frente deles mesmos, há um outro muro, tão ou mais resistente que o deles, ambos se movem de maneira arrastada, lenta e silenciosa, um passo de cada vez, metro a metro, um em diração ao outro, todos fiéis ao seu próprio Rei, e quando se encontrarem bem no centro do campo de batalha, um dos muros inevitavelmente cairá, e seu Rei nada fará a não ser se esconder no mais profundo e escuro aposento de seu castelo.
Os possantes cavalos saltarão seus corpos, levando em seus dorsos aqueles que ainda têm vida, eles são velozes, pernas velozes e corações nobres, o escudeiro perfeito do blindado guerreiro. Eles não só saltarão os corpos aliados, por ordem dos seus senhores, eles pisotearão os inimigos, darão violentos coices nos miseráveis, quebrarão as costelas, pernas e colunas dos infelizes, e os cavalos do outro lado, obviamente farão o mesmo.
Basta rezar, pedir à Deus que aquele dia passe voando, que aquela batalha suma dalí, que aquele sangue não apodreça sobre aquele amaldiçoado tabuleiro. Há bispos para tal função, dois deles em cada reino, eles são a imagem e semelhança da fé, e rezam como que incansavelmente, são homens de alma pura assim declarava os mensageiros aos camponeses, são os olhos e ouvidos de Deus sobre esta terra e por via deles, os anjos vos resguardam, homens e mulheres, confiais neles e mal algum lhes encontrarás. Em meio a matança eles dizem ''com Cristo, de Cristo e em Cristo, idade de Cristo, morte e ressurreição de Cristo, salvai-os, Cristo'', no entanto o sangue no campo não para de jorrar.
Protejam-se nas torres! Elas jamais virão a baixo ou serão violadas pelas hordas do inimigo! Conduzam mulheres e criança para a torre! Elas resistirão!
As torres não caem, eis um afirmação fácil de se acreditar, como algo esculpido na rocha viria a baixo? Ainda que milhares de flechas e lanças e pedras arremessadas a tudo o que é distância a acertassem em seus alicerces, tal construção mal se abalaria, no entanto ela pode sim ser vencida, em algum momento suas provisões chegarão ao fim e qual dos seus refugiados suportarão tão cruel sede e fome?
Um amedrontado menestrel cruza apressado os longos e abandonados corredores do castelo que lhe abriga ancioso por encontrar a Rainha, seu Rei o ordernou, ''Vá, tolo no momento inutilizado, traga a minha senhora à mim!'', talvez seja essa a razão de toda aquela guerra, qual outra razão que não oferecer à mulher amada toda a riqueza do mundo? Eu, se caso Rei fosse, faria o mesmo, lutaria eu por cada feudo e peça de ouro existente a minha volta, lutaria só por ver minha Senhora coberta de jóias, tomada por pedras preciosas, comendo e bebendo do que há de melhor, vestida como se Deusa fosse, como se Fruta D'Ouro fosse, lutaria eu em nome de minha Rainha.

4 comentários:

  1. Amei o texto. Parabéns!!! Amo ler os seus textos.
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  2. Amei o texto. Parabéns!!! Amo ler os seus textos.
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  3. Pior mesmo é quando percebe que o inimigo é você mesmo...

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  4. Belíssimo texto; Parabéns.

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